Minha iniciação na Música Espírita
Sendo espírita e músico amador desde os meus treze e catorze anos, é, pelo menos, curioso o fato de só ter começado a trabalhar com Música Espírita com quase 40 anos. O fato é que o espiritismo que eu conhecia até os 18 anos era, para a teoria, o estudo dos livros espíritas e, para a prática, o da aplicação diuturna dos conceitos de reforma íntima e da caridade. Meus pais, mais interessados em nossa formação moral cristã do que em sectarismos religiosos, nunca deram a mim ou a meus irmãos um direcionamento para essa ou aquela religião. Devíamos respeitar todas como partes legítimas de uma mesma Verdade.
Havia tentado, por várias vezes, fazer catecismo na igreja ao lado da vila em que morava e assistia, vez por outra, cultos evangélicos na televisão. Tentava ler livros sobre parapsicologia e projeção astral. Quando eu tinha treze anos, meu pai, vendo minha curiosidade por assuntos metafísicos, conversou comigo sobre o mundo dos espíritos. Descobri, pelas palavras dele, que ele e minha mãe eram espíritas; ele, Kardecista e ela, umbandista. Descobri depois que não existe o conceito espírita umbandista, pois o Espiritismo havia nascido na França com Kardec. Espiritismo é Espiritismo; Umbanda é Umbanda. Creio que o meu pai tenha explicado desta forma, em sinal de respeito à crença dela e para mostrar que minha mãe e ele pensavam bem parecido.
Durante parte da adolescência, assisti a reuniões mediúnicas semanais que o meu pai dirigia e era também o doutrinador. O grupo era bem pequeno: meu pai, minha avó, meus três tios (que eram os médiuns) e eu. Meu pai foi muito corajoso em me permitir fazer parte delas. Algumas raras vezes, minha mãe, que era médium no centro de umbanda Caminheiros da Verdade, ia nas reuniões do meu pai, pois médium é médium em qualquer parte. Algumas sessões eram bem agitadas, outras nem tanto. À algumas delas, bem raras também, o espírito de meu avô comparecia. Aprendi nas reuniões a ver o sofrimento espiritual e o nosso dever em ajudar os outros também no outro lado da vida.
No final de minha adolescência, meu tio adoeceu gravemente e ele e minha tia tiveram que parar de ir às reuniões. Elas então foram rareando e, após décadas ininterruptas de atividade, as reuniões foram descontinuadas. Por 25 anos, meu pai as dirigiu, continuando o trabalho de meu avô, que as presidiu também por um bom tempo.
A partir dos 18 anos, tentei me a adaptar, sem sucesso, a outras casas espíritas. Sem o ambiente amoroso das reuniões conduzidas pelo meu pai, achava esses centros muito impessoais e pouco acolhedores. Em alguns, fiquei por mais tempo e lembro que tocava em algumas festividades ou na evangelização infantil. Não sabia nada de música espírita; logo, tocava as canções de MPB que conhecia e aquelas, cuja a cifra alguém trazia. Como era muito jovem e priorizava outras atividades (estudo acadêmico, o trabalho-sustento e, sobretudo, a música), acabei não encontrando tempo para participar de casas espíritas. Enquanto isso, continuava lendo e estudando sobre o espiritismo por conta própria.
Com 29 anos, fiquei sabendo que a peça "Há 2000 Anos" sobre o livro homônimo de Emmanuel estava para ser encenada em um teatro próximo de casa. Já tinha lido o livro e me emocionado com ele dez anos antes. Fui assistir a montagem e, quando ela terminou, corri até o camarim para conhecer o elenco e acabei me voluntariando para participar da peça do jeito que pudesse. O diretor teatral me acolheu e acabei fazendo alguns personagens que entravam mudos e saíam calados (guarda n°2, espírito de luz n°3 e espírito trevoso n°5). Fazia também o senador Pompílio Crasso, que morria em cena e só tinha duas falas: (- Nããããooo!!! e depois - Ahhhh!!!). Fiquei dois anos e meio encenando essa peça. Durante esse tempo, entraram no grupo alguns atores que sabiam cantar. Foi então que me colocaram para tocar violão na peça, além dos quatro personagens que eu fazia.
Em 2004, aos 34 anos, ouvi falar pela primeira vez em músicas espíritas. Quem me falou, procurou cantar algumas a capella. Não gostei de nenhuma e desdenhei da Música Espírita, dizendo, na época, que música e espiritismo não combinam. Eram dois movimentos contrários. Música é expressão, é exteriorizar os sentimentos. Espiritismo é introspecção e estudo. Não podiam combinar... Não podia estar tão errado.
Em 2005, conheci o amigo Aldo Trazzi Jr através de um anúncio no site "Forme a Sua Banda". Naquela época, pretendia formar uma banda inspirada em 14 Bis, Roupa Nova e Rádio-Taxi. Na mesma conversa inicial, Aldo me disse que tinha uma banda espírita chamada Nova Luz. Fiquei interessado no assunto e ouvi algumas músicas da banda dele e também do GAN (Grupo Arte Nascente) de Goiânia. Naquele momento, queria muito fazer parte de uma banda espírita; contudo, minha motivação era mais musical do que religiosa e eu ainda era muito descrente da relação entre Música e Espiritismo. O tempo passou e com ele, fui recebendo várias propostas de trabalho com música espírita. Sendo paulatinamente arrastado para esse novo campo de trabalho voluntário, aos poucos, percebi a beleza de se utilizar a música para fazer e divulgar o bem.
Tudo o que escrevi acima foi para mostrar como, sendo espírita, fiquei tanto tempo sem conhecer Música Espírita, Mocidade Espírita, COMEERJ, Concafras, etc. Nunca gostei de Carnaval e, com certeza, teria curtido bastante esses encontros fraternos. Infelizmente, passei bem ao largo disso tudo.
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